Vim pelo caminho difícil,
A linha que nunca termina,
A linha bate na pedra,
A palavra quebra uma esquina,
mínima linha vazia,
a linha, uma vida inteira,
palavra, palavra minha.
Paulo Leminski
Para celebrar 20 anos de carreira, Antonio Bokel, que sempre demonstrou um
notável domínio das figuras geométricas, apresenta pela primeira vez um projeto
instalativo em diálogo com a paisagem e os jardins do Museu da República. As
palmeiras imperiais, simetricamente alinhadas, formando um corredor de passagem
até o final do terreno, despertaram a imaginação do artista. Estava ali diante da
geometria, do ponto no horizonte para onde todas as linhas paralelas convergem,
o ponto de fuga. O conceito, utilizado para criar a ilusão de profundidade e
perspectiva, foi transportado para o interior da Galeria do Lago onde Bokel repete
o alinhamento das palmeiras usando totens em aço cortem. O espectador que
atravessa o caminho, participa da experiência visual de profundidade, percebendo
que o afunilamento das linhas o leva na direção de um ponto de convergência que
atrai o olhar naturalmente. No final, um espelho reflete os totens dando a ilusão da
continuidade do ponto de fuga. Mas o espelho é também um enigma, acionando
olhares, trazendo a imagem do espectador para dentro da obra. Revela a interação
do público, seu comportamento diante da geometria dos elementos, da luz interna,
do espaço limitado. Impossível não lembrar de Clarice Lispector que, diante de seus
espelhos, revela: “Eu sou o meu próprio espelho. E vivo de achados e perdidos.
Estou metida numa guerra invisível entre perigos.” Bokel, entretanto, oferece uma
trajetória segura, permitindo múltiplas percepções nessa travessia.
Antonio Bokel, em Ponto de Fuga, expõe toda a simplicidade e ao mesmo tempo
toda a força de seu trabalho. Ao desejo de rigor e precisão o artista opõe sua
poética que envolve a beleza das formas, a profundidade de suas pesquisas e o
olhar generoso sobre a experiência estética. É um artista contemporâneo dialogando
com a história e a paisagem do Palácio do Catete, numa troca que privilegia o
essencial. Se a geometria foi o ponto de partida para essa fase em que a escultura
ganhou o protagonismo, existe em sua obra uma diversidade de perspectivas, de
opções que envolvem a criatividade e a clareza dos resultados.
ISABEL PORTELLA
curadora